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Tá todo mundo mal: o que as mídias sociais têm a ver com isso

28 de setembro de 2021

Opinião

Há sete anos a youtuber Jout Jout publicou em seu canal o vídeo “Tá todo mundo mal” do qual traz na narrativa a exemplificação de uma cena em que Jout Jout diz: “você tá lá sofrendo, triste, deprimida, mas aí você fala ‘ah aqui, a paisagem bonita dessa praia… [tira uma foto e posta] aí o que o mundo vê? Você numa praia bonita, ele não vê o que tinha antes… você andando deprimida, num trabalho que você não gosta… é tudo uma grande mentira, a gente fica mentindo o tempo todo…”. Bom, essa não é só uma constatação empírica da Jout Jout, o próprio Facebook realizada experimentos sobre contágio emocional em larga escala desde 2012.

Coincidência ou não (ou perversidade ou não), em pleno setembro amarelo, o Facebook confirmou por meio de mais uma de suas pesquisas que o Instagram é prejudicial para adolescentes. As análises, que foram realizadas nos últimos três anos na plataforma, tiveram como foco apresentar inferências sobre saúde mental, discurso político e tráfego de pessoas. No que se refere à saúde mental, o estudo aponta que 32% das meninas adolescentes relatam que quando se sentem mal com seus corpos, o Instagram as fazem se sentir ainda pior. Outro dado informa que os adolescentes consideram o Instagram culpado pelo aumento de depressão e ansiedade. A respeito de pensamentos suicidas, 13% dos usuários britânicos e 6% dos usuários americanos desenvolveram o problema por meio do Instagram.    

Obviamente que a empresa sabia dos danos à saúde mental durante a condução das pesquisas e dos variados testes na plataforma. Em um mundo menos distópico poderíamos dizer que existe aí um dilema moral, mas na verdade o dilema é financeiro. Em 2019 o Instagram faturou 20 bilhões de dólares com receita de publicidade. Os usuários com 22 anos ou menos compõem 40% dos usuários da plataforma e só nos Estados Unidos são cerca de 22 milhões de adolescentes. Os pesquisadores da empresa estão em busca de reduzir os danos à saúde mental, mas sem deixar que aconteça uma debandada da plataforma o que significa prejuízo financeiro para os negócios de Zuckerberg.

Em 2017, o estudo “Uso de redes sociais, influência da mídia e insatisfação com a imagem corporal de adolescentes brasileiras” já dava algumas pistas do tamanho do problema. As pesquisadoras utilizaram como métodos um estudo transversal com dados demográficos e antropométricos, questionário sobre frequência de acesso às mídias sociais e as possíveis influências. Para analisar a Imagem Corporal (IC) o estudo se baseou na Escala de Silhuetas Brasileiras e a avaliação da influência da mídia foi feita pela subescala 1 de internalização geral da Escala de Atitudes Socioculturais em Relação à Aparência (SATAQ-3).

Participaram do estudo 212 meninas adolescentes estudantes de escola pública e de uma organização não governamental da capital paulista e do Interior de São Paulo. Dentre os resultados, 85,8% estavam insatisfeitas com a Imagem Corporal e o acesso diário maior de 10 vezes ao dia ao Facebook e Instagram aumentou a chance de insatisfação em 6,57 e 4,47 vezes, respectivamente. As pesquisadoras concluem que as mídias sociais estão associadas à insatisfação da Imagem Corporal de meninas adolescentes.

Tenho falado repetidamente por aqui sobre a importância de refletir a respeito de problemáticas complexas como essa a partir de uma lente interdisciplinar e intersetorial. É uma tarefa da educação e literacia midiática? É uma missão da psicologia e o trabalho com reforço de autoimagem? É uma questão de regulamentação de mídia e de limites éticos quanto ao uso de dados? Pode ser um problema de todas essas e de outras áreas, mas é, principalmente, sobre estabelecer limites e punições ao Facebook (e a outras big techs) que vem reiteradamente usando dados indevidamente e causando diversos estragos individuais e coletivos em diversos países.   


A opinião do colunista não necessariamente representa o posicionamento do Bitniks.