Cultura

Cinco anos e uma pandemia depois, como está Pokémon GO no Brasil?

Praças viraram pokeparadas. Vizinhos se tornaram amigos. Celulares foram roubados. Relacionamentos acabaram. Mesmo assim, a caça de pokémons se mantém firme e forte.

Você pode até não jogar Pokémon GO, mas com certeza já ouvir falar nele. O game de realidade aumentada chegou ao Brasil em agosto de 2016 e desde lá conquistou milhares de fãs por aqui. Por ser gratuito para baixar e jogar – com vendas dentro do jogo, se tornou uma ótima opção para as pessoas saírem na rua caçando monstrinhos. Mas o cenário mudou com a pandemia,

Sua característica multiplayer deixa a experiência ainda mais divertida quando você joga com amigos ou familiares – foi assim com a família Kato. Moradores do bairro de São Mateus, na Zona Leste da cidade de São Paulo, a escritora Leila e seus três filhos “comandam” a caçada na Avenida Sapopemba, principal via da região. Uma das metas é criar um ginásio na sala de casa.

A família Kato joga Pokémon desde que o game chegou ao Brasil e conta que, quando começaram, o bairro deles “era tudo mato”. Literalmente, já que o mapa do jogo é predominantemente feito de grama. Mas naquela época, você não encontraria nem ginásios ou pokeparadas por lá.

“Baixamos logo que lançou, mas aqui no bairro não tinha muita coisa. Quando dava, a gente ia para o [Parque do] Ibirapuera. Aí depois, descobrimos grupos [de jogadores locais] na internet e WhatsApp e ficamos por aqui mesmo”, conta Leila Kato ao Bitniks.

Mas, desde o início de 2020, os jogadores de Pokémon GO tiveram suas caçadas afetadas pelas diversas restrições sanitárias. “Quando íamos ao Ibirapuera, a gente andava bem mais. Agora, só quando aparece alguma coisa diferente saímos de casa. Hoje em dia, dá para jogar bastante sem sair”. 

Ginásios e equipes

Hoje, a família Kato foca na caçada pela Zona Leste. “A gente já tem um trajeto pré-definido, onde tem os ginásios. Se tiver alguém para duelar no ginásio, a gente já derrota e coloca os nossos pokémons”, diz Leila.

Bom, se você conhece Pokémon apenas pelo desenho, não deve ter entendido muito bem essa história de colocar os pokémons no ginásio. Isso porque no desenho, Ash Ketchum sempre tinha que derrotar o líder do ginásio e conquistar a insígnia de lá. Mas o ginásio continuava sendo do líder, que geralmente era o melhor na sua especialidade [fogo, água, psíquico e etc]. 

No jogo, a partir do nível 5 você, pode visitar e desafiar os ginásios, que são dominados por equipes. Que equipe? A equipe Rocket? Nãaao. São três no jogo: o Time Mystic, de cor azul, que tem como seu guardião o Pokémon lendário Articuno; o Time Instintic, de cor amarela, representado pelo lendário Zapdos; e o Time Valor, de cor vermelha, com Moltres.

Todo jogador precisa escolher sua equipe em algum momento e essa divisão é fundamental na hora de conquistar um ginásio. Por exemplo, se pessoas do Valor – vermelho – vencerem em um ginásio amarelo, significa que esse espaço não pertence mais ao Instintic. Os jogadores também podem enfrentar ginásios dominados pelo próprio time para aumentar o prestígio dele. Quanto maior o prestígio de uma equipe no ginásio, mais difícil será para outras equipes dominá-lo.

Início das jornadas

Na família Kato, o azul é predominante. Leila, Luis(o mais velho) e Julia (a caçula) são do time Mystic, enquanto Bruno (filho do meio) é da equipe Valor, e todos ainda jogam com a primeira conta que criaram em 2016. Muito antes de pensar em qual equipe seguir, Leila já se preocupava com qual seria o seu primeiro pokémon. No coração dela, a opção era o Squirtle (água), mas um truquezinho permitiu que ela conseguisse capturar um Pikachu  como inicial e ela considerou mais vantajoso.

Veja como funciona neste vídeo:


Atualmente, não é toda a família Kato que joga com assiduidade, Luis entra poucas vezes na semana e Júlia menos ainda, por causa dos estudos. Leila ainda joga com frequência, mas Bruno é o mais experiente da casa. “Eu sempre gostei de Pokémon, mas o Bruno começou a jogar com mais afinco. Hoje ele tem 18 anos, mas há quase seis anos, ele era um menino e queria caçar pokémon na rua, e eu ia acompanhá-lo”, conta Leila. Segundo o irmão, Luis, Bruno não apenas se esforça para caçar e evoluir, ele estuda o jogo e está sempre por dentro das novas regras. Por isso, ele sempre consegue deixar o personagem e os pokémons muito fortes.

Luis teve seus altos e baixos no jogo. Diferentemente da família que esperou o jogo chegar oficialmente ao Brasil, ele já experimentava a plataforma com um arquivo .apk que podia ser baixado em alguns blogs e instalado manualmente em celulares Android. Ele conta que o principal motivo de não ter seguido firme no Pokémon GO foram as diferenças do game para a história original (como o caso dos ginásios). Mas isso não foi tudo.

“Em 2017 eu fui assaltado perto de casa. Eu falei ‘putz, não quero mais ficar [na rua] com o celular na mão’, e no jogo você tem que ficar com ele o tempo todo. Eu não quero isso, não quero ficar com medo de estar na rua e ser assaltado por estar jogando Pokémon. Seria o cúmulo”, afirma Luís, que voltou a jogar um pouco mais com o início da pandemia. Apesar de não ser mais tão dedicado ao jogo, o irmão mais velho aproveita seus exercícios de caminhada para acumular quilômetros com a “sincroaventura” e assim chocar os ovos dos seus “mascotes”.

Cuidados necessários ao sair caçando Pokémons

Conforme alertam as autoridades da saúde, é muito importante que todos tomem os cuidados necessários ao sair de casa. Entre as recomendações está o uso de máscara, preferencialmente PFF2 ou N95, álcool em gel para higienização das mãos e distanciamento físico.

Além dos cuidados com a pandemia, o jogador de Pokémon GO que se aventura em caçadas na rua precisa ficar muito atento aos veículos e outros pedestres. Também é preciso tomar cuidado com os pertences. Muitos dos jogadores que saem para fazer Reides (batalha contra pokémon lendário) utilizam mais de uma conta do jogo e levem mais de um celular consigo. Segundo a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, celulares e afins representam 26% dos roubos no estado em 2021. Fique sempre alerta!

A “sacola” de pokémons dele é bem farta. Seu pokémon mais forte é o Garchomp (Dragão/Terrestre), com 3679 Pontos de Combate, mas o favorito é o Piplup. Afinal, quem não gosta de pinguins? Apesar disso, nenhum deles tem uma história tão especial quanto a do Landorus (Terra/Voador). O pokémon lendário deu tanto trabalho para Luis que ele precisou apelar para as habilidades de captura de Bruno. 

Além de entreter e distrair a família Kato durante esses meses de pandemia, Pokémon GO se tornou uma rede que conecta vizinhos que talvez nem se conheceriam se não fosse por ele. Fora isso, o game não possui barreira etária e, por esse motivo, crianças, adultos e idosos jogam em conjunto e com condições parecidas. Como é o caso do grupo de amigos da região do Parque São Jorge, localizado no Tatuapé, também na ZL de São Paulo.

A herança do mestre

Antes de mudar para os arredores do Parque São Jorge, em 2018, o jornalista Raphael Ponce quase não jogava Pokémon GO, mas agora ele entra quase todo dia. O motivo para essa mudança de hábito? Um mestre. O sr. Toshio, de 74 anos que, apesar da idade, andava vários quilômetros em busca dos pokémons da região. Desde 2016, o trabalho de Toshio como caçador inspirava muitos jovens da região e ele logo criou um grupo no WhatsApp para que todos pudessem interagir durante as caçadas, Reides, eventos e tudo mais.

Jogadores se reúnem para caçar pokémons. Foto: Pedro Ribeiro

Em pouco tempo, dezenas de pessoas passaram a compartilhar informações sobre os melhores pontos para caçar, além de criarem pokeparadas e ginásios em locais interessantes para todos. Infelizmente, Toshio morreu no ano passado – a morte não teve relação com o coronavírus. A perda causou sentimentos diferentes em todos do grupo. Muitos pararam de jogar, enquanto outros decidiram se esforçar ainda mais. “Já fez um ano que ele morreu e eu acabei cuidando do grupo, coordenando e adicionando pessoas.

Em 2018, quando eu vim para cá, encontrei o sr. Toshio na praça, aí ele me colocou no grupo”, conta Raphael, que afirma ter criado muitos vínculos no grupo. A equipe de caçadores do Tatuapé é formada por vários perfis: alguns que jogam sozinhos no dia a dia, mas gostam de ter grupos para Reides, como é o caso do Raphael, e famílias, como o caso dos Kato.

Namorada vs. Pikachu

Falando em família e relacionamentos, Raphael contou que já viu um amigo terminar o relacionamento por causa do jogo. Segundo ele, ainda em 2016, o colega, que não teve o nome reveladom estava em uma má fase com a então namorada. Em um certo dia, Raphael resolveu levar o amigo para caçar pokémons no Parque do Ibirapuera. Quando a jovem soube da programação ficou incrédula e decidiu romper o namoro de uma vez por todas. Meses depois, o rapaz entrou em um relacionamento, mas nesse o jogo não era problema. Mesmo assim, ele preferiu parar de jogar.

Pelo menos uma vez na semana, geralmente aos sábados, Raphael sai para caminhar e caçar. “O começo da pandemia foi ‘osso’, fiquei três meses sem sair e estava entrando em depressão. Isso acumulou com a ansiedade do TCC. Aí eu pensei: ‘vou pegar minha máscara, sair de casa sábado e jogar um pouquinho, porque não está dando certo’”.  Além de ajudar a cabeça, ele diz que o jogo também ajudou a recuperar parte do condicionamento físico que ele tinha antes da pandemia.

Após a criação do grupo, Raphael conta que a disponibilidade de pokeparadas e ginásios na região aumentou muito – mas tanto que ele chegou a reclamar da proximidade dos ícones. “Você tenta clicar em um e acerta o outro”. Segundo a contagem do aplicativo, ao todo, o jornalista já andou 48 mil quilômetros desde que começou a jogar, em 2016. Bom, considerando que o perímetro da Terra é de pouco mais de 40 mil km, o jornalista poderia ter dado a volta e ainda sobraria quilometragem nas pernas para ele ir e voltar da Colômbia.

Essa contagem faz sentido? 

Não! Essa quilometragem só foi alcançada porque, assim como vários outros treinadores, Raphael utiliza uma “gambiarra” para chocar os ovos dos seus pokémons sem precisar andar tanto. Instalando um aplicativo chamado DeFit, usuários conseguem “driblar” o GPS do celular e fazer o jogo entender que eles andaram dezenas de quilômetros. 

“Antigamente eu andava 50 km de boas [em uma semana]. Aí com a pandemia, que eu saio uma vez ou outra, eu uso o DeFit mesmo, porque não tem jeito. Foi uma maneira que eu encontrei de continuar jogando”, explicou ele, um segundo antes de um novo ovo chocar e sair um… Diglett de Alola (o que tem peruca loira).

Cuidado! Essa técnica conhecida como spoofing, apesar de muito comum, é proibida, e está destacada no site oficial da Niantic, desenvolvedora do Pokémon GO. As sanções podem variar desde banimentos temporários a permanentes.

Nos jogos da Niantic, os métodos de trapaça podem incluir, mas não estão limitados a:

  • Usar software modificado ou não oficial;
  • Jogar com várias contas (uma conta por jogador);
  • Usar ferramentas ou técnicas para alterar ou falsificar sua localização (“spoofing”);
  • Compartilhar contas;
  • Explorar intencionalmente um bug para ganhar recompensas;
  • Abusar da política e do mecanismo de reembolso;
  • Comprar ou vender moedas, ou itens do jogo em plataformas de terceiros;
  • Compra/Venda /Contas de negociação;
  • Ou qualquer outra atividade que viole os Termos de Serviço da Niantic.

Enfim, o importante é jogar para se divertir. Toda semana chegam novos eventos e jogos com missões que treinadores iniciantes também podem cumprir.